A viagem gastronómica do Ocean pela Ásia

Nos últimos cinco anos, Hans Neuner e a equipa do Ocean embarcaram na sua própria "Era dos Descobrimentos", procurando conhecer a gastronomia portuguesa através de uma série de “viagens ao passado”. Cada uma delas levá-los-ia a uma parte diferente do mundo explorado durante a Era dos Descobrimentos em Portugal.

Entre os séculos XV e XVII, navios partiam do Algarve em direção ao desconhecido, o que conduziria à descoberta de novas terras, diferentes culturas e, sobretudo, de novos ingredientes e métodos de confeção provenientes do Novo Mundo. Tudo isto teve um impacto profundo na cozinha europeia, transformando-a de formas que ainda hoje são evidentes.

O caminho marítimo para a Índia, estabelecido por Vasco da Gama, a exploração de África, da América do Sul e do Brasil, foram empreendimentos inacreditáveis para a época, que acabariam por conduzir a posteriores expedições à Ásia e ao Extremo Oriente.

Os sabores exóticos e as especiarias encontradas, incluindo a pimenta, a canela, o cravinho e a noz-moscada, viriam a conferir novas dimensões à cozinha europeia. Mas o intercâmbio de alimentos e métodos de cozedura não foi unilateral. Os portugueses levaram também consigo as suas próprias tradições culinárias, influenciando para sempre as cozinhas e os pratos das regiões visitadas.

Assim, na sua última viagem gastronómica deste projeto que durou cinco anos, Hans viajou para a Ásia em busca das origens, influências e sabores do comércio de especiarias e, claro, de inspiração para o seu mais recente menu.
 

Bem, começámos por Banguecoque. Já lá estive muitas vezes. Na verdade, cresci com alguns amigos tailandeses, por isso visitei muito a Tailândia com a família na minha infância. Sinto-me em casa lá, e desta vez levei os meus Chefs comigo, para os ajudar a ter uma verdadeira perceção da cultura local.

O país mudou muito desde então, mas a comida manteve-se tradicional, fiel às suas raízes. A cozinha tailandesa vem de há centenas de anos, e a comida de rua e os mercados mantêm vivas essas tradições. As cores, os produtos... pode encontrar-se de tudo, dos insetos mais pequenos até aos gafanhotos… na Ásia isso faz parte da cultura, comem de tudo. Há um ditado chinês que diz que tudo o que ande, nade, rasteje ou voe de costas para o céu pode ser comido!

Encontrei-me com alguns velhos amigos e alguns grandes Chefs. Deepanker Khosla, o cozinheiro do Haoma, que conhece muito bem a cultura gastronómica do país, guiou-nos pelas redondezas. Ele é uma pessoa extraordinária, com uma história fantástica. Começou com uma carrinha de comida, conduzindo-a ele próprio, foi crescendo e evoluindo, e agora tem vários restaurantes. É uma história impressionante! Conhecemo-nos no Ocean há alguns anos e ele convidou-nos para o visitarmos em Banguecoque. Trabalhar com ele lá foi uma ótima experiência e explorar a cidade foi ainda melhor. É um lugar imenso, com tanto para ver e tanta comida boa!

 

Estivemos lá por outros quatro dias. Há uma forte ligação portuguesa aqui, era uma colónia até há 100 anos. Ainda se podem observar as influências, apesar de ter havido um enorme desenvolvimento na região. Os nomes das ruas ainda são em português e, na cidade velha, reconhece-se a herança arquitetónica, pelo que, apesar de muita coisa ter desaparecido, ainda se encontram traços de Portugal.

Até mesmo na comida, ainda se nota a presença de Portugal, alguns sítios eram quase como uma tasca lisboeta, onde comemos comida simplesmente fantástica. Encontrámos um prato que nos inspirou muito, com carne de porco ibérico num sumo de laranja envelhecido por 20 anos, muito doce e muito ácido. Foi o melhor prato que provámos e mostrou a polinização cruzada que nós próprios pretendemos fazer, misturando influências portuguesas e asiáticas.

Uma experiência fabulosa, acho que se pode aprender muito sobre gastronomia através de muitas fontes, é uma questão de conhecer a cultura, a música, a arte. O nosso guia chamava-se Sunshine, um tipo adorável do qual dependíamos muito, porque a comunicação era sempre um problema ali. Mas isso também é bom, faz-nos usar a linguagem gestual e fazer desenhos, faz tudo parte da experiência de viajar!

Seul é uma cidade muito moderna, com muita música, muitas cores. Têm aqueles restaurantes de churrasco fantásticos, onde se come à volta de uma mesa com um grelhador lá dentro, e onde se come em conjunto, como uma família. E depois havia o kimchi! Fomos ao museu do kimchi e devemos ter provado centenas de kimchi diferentes! Era algo que queríamos mesmo compreender, para integrar no nosso menu.

Sim, e este é um aspeto interessante das influências portuguesas, porque Portugal levou a Tempura para o Japão. Os marinheiros utilizavam esta técnica, com farinha de milho, para ajudar a conservar os alimentos durante as expedições. Esta era uma parte de uma rota comercial, que se manteve durante centenas de anos. Quando regressavam, levavam para a Europa noz-moscada, tamarindo, canela e todas estas novas especiarias. Queremos ser capazes de recriar esta experiência no nosso menu.

A disciplina dos Chefs era incrível! Conhecemos um Chef de Tempura que trabalhou durante 46 anos e ainda não era um mestre! Na verdade, o seu mestre já o fazia há 60 anos! Mesmo depois de todo este tempo, continuam a sentir-se honrados por fazerem parte da tradição. Por isso, apesar de Tóquio ser uma cidade muito moderna, mantém estas fortes tradições. Vimos lutas de sumo, teatro japonês, tudo muito ritualista e bonito. É um local espantoso! Para mim, isto faz parte do crescimento como Chef, estar sempre aberto a aprender coisas novas.

É sempre uma experiência incrível visitar estes lugares, há sempre tanto para ver e aprender! Agora que chegámos ao último ano da nossa era de descobertas, podemos olhar para trás e analisar tudo o que aprendemos.

Nesta última viagem, visitámos uma cultura completamente diferente de todas as anteriores, e isso é inspirador. É um verdadeiro desafio tentar recriar a experiência, mas também garantir que captamos a história, a mistura da cultura portuguesa e asiática, a forma como influenciaram a comida e a história de cada uma delas...

Tratava-se efetivamente de comércio, troca de produtos, mas também de ideias, pelo que temos de mostrar que a ligação entre estas pessoas mudou para sempre a alimentação em todo o mundo. É uma etapa emocionante para nós e estamos ansiosos por partilhar o testemunho do nosso tempo na Ásia com o resto do mundo!